quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Desafogo.

"Toda trilha é andada com a fé

De quem crê no ditado

de que o dia insiste em nascer"


Primeiro paro diante do espelho e me observo: falta água.

Estou murcha, perdi algumas pétalas e os espinhos não me protegem como antes, pelo contrário. Estou seca, sem adubo, perdendo a vida e o verde já não me veste mais. O marrom anda combinando mais com meus olhos, que estão tristes, mas ainda lutam por um pouco de amor. Vou me desfolhar, me despetalar e isso vai doer – embora já esteja doendo ainda que não assuma – até que, finalmente, eu veja um pequeno botão cor vermelho-sangue, esse vermelho que sempre me vestiu bem, que mostra o ápice da existência na minha íris, que me faz inspirar – e encontrar - o cheiro de vida no meio da decomposição de uma era que foi difícil dizer adeus. Então eu vou escutar todas as músicas, rever todas as lembranças, apoiar minha mão sobre meu coração e deitar encolhida abafando meu choro, porque é uma dor só minha, uma dor que preciso vivê-la sozinha, uma dor que precisa consumir meu corpo e minha alma para, enfim, eu me libertar. Uma dor que ninguém tem que perguntar o porquê, que ninguém precisa me acalentar, porque é minha, só minha e só eu sei. Só eu sei a mistura de todas as angústias, de todas as pontadas. Só eu sei a sensação do passado pontiagudo enfiar-se dilacerante sobre meu peito e ficar remoendo na ferida aberta, lembrando-me que eu ainda não me desapeguei e que me finquei mais fundo do que eu podia.

E apesar de todo esse egoísmo, tem gente que eu sei que não vai embora, tem gente que consegue formar um sorriso no meu rosto e fazer derramar algumas lágrimas de felicidade, porque nem tudo é fim de festa, fim de noite e fim do pouco de nós. E eu sei que posso seguir em frente, que eu tenho força pra isso, que eu tenho astúcia para o novo, que eu tenho idéias para o meu progresso, que eu tenho amor dentro de mim.

E acaba que alguém vem, pega um pouco da minha dor, limpa minhas lágrimas e aponta para o futuro, então eu rio e percebo que não estou só.


E que nunca estarei, apesar dos invernos cortantes da vida
.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Uma pitada de conversa Robertista

E depois de ter mastigado e engolido todos esses sentimentos, até então não triturados, eu fiquei esperando ansiosa pelo final da digestão. Foi a melhor opção, estava sem condições de ficar me digladiando com os peixes estranhos e cegos, foi por isso que resolvi mergulhar no silêncio da região abissal. Gosto bastante do silêncio, aliás, o silêncio tem sido a melhor música nestes últimos tempos. Depois é só sair sozinha, sem rumo e com todos esses pensamentos (e um caderno para anotar todas as receitas das idéias). No entanto, vomitarei toda essa pressão da vida antes do meu passeio, não quero levar pesos nem medidas, não mesmo. Eis que viver, também, é estar em resguardo do exterior, de todo esse calor, de todos esses peixes... E ando com tanta preguiça para esses peixes que fugir deles e se refugiar em mim vem soando tão reconfortante, que vou dar um murro na próxima pessoa a qual me falar que não ando vivendo.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Corda bamba.

Não quero que me doa nada hoje. Nem amanhã. Nem depois. Quero ponto final em tudo, quero que tudo chegue logo no final, que se acabe. Mas não quero isso de um todo querer. Quero de querer um pouco, a outra parte do querer fica na surpresa do mistério. Por isso meus quereres se dão tão bem. Pólos energicamente contrários. Falta, apenas, um pouco mais de emoção, de circo: malabares, cores, mágicas, brincadeira, risadas e piruetas. Só não falta a platéia. É um espetáculo para poucos, ou ninguém - além de mim - ou apenas um par, quem sabe. Talvez, no final, eu descubra o ímpar: só o eu.

Por enquanto, sou equilibrista e nada mais.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Perfume da pele: à sensação. Ao prazer do toque. Ao queimar da epiderme. À fumaça dos poros.

“Ando tão à flor da pele
Que até um beijo de novela me faz chorar”
(Zeca Baleiro)




Ela nem percebeu direito quando ele chegou. Quando tudo aconteceu, de súbito. Ela foi se descobrindo gradativamente:
Primeiro, a confusão.
Segundo, a doença.
Terceiro, a aceitação.
E o quarto ponto ainda está a se desenrolar. Está, ainda, caminhando sobre linha tênue que separa o mergulho de ponta, a imersão de todo o corpo – e alma – ou cair do outro lado, afastado, em um horizonte iludido, distante de tudo isso.
Contudo, ela sabe. Ela sabe com todas as L-E-T-R-A-S que não se pode fugir disso, seja lá o que isso for. Seja lá o que signifique.
Uma vez, tudo bem, há o perdão. Duas vezes, não está tudo bem, tem algo dissemelhante.
Há o perdão, ainda! Mas não se pode correr. E é um deus-nos-acuda. Uma lambada de pensamentos. Um punhado de notas musicais. E ¼ de lágrimas não caídas. Além das gargalhadas, claro. Além do tudo pode acontecer, inclusive o nada.
Ele ainda está lá. Está sorrindo para ela, criando ciúmes nela. Prendendo-a sem nem saber. Dizendo palavras que eleva o [des]conhecido dela, tomando atitudes que germina a dúvida dentro dela. E, por enquanto, ela é só isso: morna. Tudo o que ela não queria ser. Tudo que ela é por tempo indeterminado.


E o quente [dela], queima à flor da pele.


segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Guarde um sonho bom para mim.

Talvez ela começasse a sonhar no estilo do “era uma vez”, mas era algo mais diferente, no estilo mais dele, no estilo de “uma vez era”. Olhados de cima, nem pareciam que existiam, sabe. Estava escuro e era noite. O céu ia estrelando cada vez que eles matavam um pouquinho da saudade. A única coisa que se via, de cima, era uns pontinhos cor-verde-que-dói-os-olhos e uma brasinha em chama. De perto, pareciam um segundo captado do clique fotográfico: o fundo escuro e eles com quase movimentos, em pause e com a legenda, interprete. Um minuto para a imortalidade em cores de outono, meio amarelado pelo flash e embaçado pela agitação da câmera - os olhos.
Ela chegou atrasada. Quando entrou na sala, ele estava lá, calmo, sentado e lendo – como de costume. Ele a viu e fechou o livro com aquele sorriso que se diz oi. Ela respondeu também, com um sorriso de olá.
- Hoje poderei desfrutar da sua companhia? – perguntou ela.
- Só se eu puder ter a tua! – respondeu ele.
- Faz tempo desde a última vez!
- É, faz tempo. Estava sentindo falta de suas palavras.
- E eu das suas.
- Vamos para a varanda?
- Vamos.
Ele sentou na rede. Ela sentou na sacada para observar o céu com mais facilidade.
- Ainda o céu. – Disse ele.
- Ainda. – ela falou olhando para cima.
- Você com seu vício inocente e eu com o meu nocivo – Disse ele acendendo o cigarro.
- Nem por isso você deixa de compartilhar os meus vícios.
- E você nunca precisou compartilhar dos meus. Diria que não faz parte da multidão em furta-cor que você carrega, mesmo sozinha.
- Eu compartilho de um vício seu: as palavras.
- Essas palavras que tanto amo.
- É, essas palavras que tanto amo e odeio. Paradoxalmente, a antítese mais gostosa da minha vida.
- Intensas! Todas as palavras.
- Como seus sentimentos. Como as cores que te compõe.
Ele riu.
Ela olhou para o céu.
- Que dia é hoje? – perguntou ela.
- Você escolhe. Pode ter sido ontem, hoje ou amanhã. Eu prefiro dizer que é agora.
- Sem linearidade.
- Sem linearidade.
- Gosto de como subentende o segredo do tempo. Tu fazes uma narrativa sem início, meio e fim instigando a quem dizes sobre o valor da estação.
- Tempo é vida.
- É tudo e nada.
- Estou em primavera.
- Eu em outono.
- Por que outonas? Sempre me pareceu tão primavera.
- Estou me resguardando do exterior.
- Para se encher dos sentimentos não-corruptos do mundo?
- Na verdade, para expor ao mundo meus sentimentos contemporâneos.
- Passei um tempo em inverno com os olhos afundados para meu “in”. Via um abismo e quando eu o encarava ele lia meus medos.
- O que você fez?
- Convidei-me para sair!
- E agora primaveras com seu “in” para “out”.
- Diria que vivo lendo meu out e escrevendo-o, mas é que o out tá tão dentro do in que às vezes misturo tudo.
Riram.
- Como você definiria nosso convívio? – Perguntou ela.
- Nuance. Para mim, não existe melhor palavra.
- Você não poderia ter definido melhor.
- Assim como você me definiu de caixa de som, na foto.
Sorriram.
- Ainda está lá.
- Ainda estou lá.
Silêncio.
- Sabe aquela sensação de que você tem um amigão/amigona e ficam grudados o dia inteiro, mas por razões do destino acabam se vendo menos no dia a dia e dá aquela saudade do tipo: véééi, preciso falar urgentemente com Maria/Chico. E aquela saudade só passa quando voltam a andar grudados de novo??
Então, é assim que me sinto quando ficamos muito tempo sem trocar palavras.
Ele a olhou com carinho.
- Sabe, essa sua mania de fazer de cada sentimento uma história diferente me encanta. Precisamos mesmo sempre prosear, falar sobre o céu, sobre o mar, sobre o mais!
Olharam-se em sorriso.
- Como é quando acorda? – Interrogou ele.
- Sei como é meu sempre. Sempre soube, desde que nos conhecemos sem nos conhecer, que és meu amigo. É sentir, sabe. Sinto que é e isso me basta.
- Sou cético. Mas quando se trata de sentir, como sabes, acredito.
- “Todo abismo é navegável a barquinho de papel”, Guimarães Rosa. Lembrei disso agora, sobre o abismo de antes, dos medos.
- “E se tu olhares, durante muito tempo, para um abismo, o abismo também olha para dentro de ti”, Nietzsche.
- O abismo nada mais é do que o lado escuro que não conhecemos da casa.
- Só acender a luz. O difícil, apenas, é encontrar o interruptor e encarar o que se viu, porque nem sempre gostamos do que vemos e apagamos a luz.
- Mas não seremos os mesmos depois da nova descoberta.
- Mas pode-se fingir.
- Fingir é superficial. Não combina com você que é intenso.
- Nem com você que é feita de amor da cabeça aos pés.
Foi a vez dela: olhou-o com carinho.
- Você é o conjunto de tudo. Se é para te falar, falaria e falo que é feito de poeticidade da cabeça aos pés. Sempre será poesia. Rapaz, vou guardar tuas cores comigo.
Ele levantou e beijou-a na testa.
- Qual será nosso próximo cenário? – Perguntou ele olhando para o céu.
- Talvez uma casinha na rua Himmel antes do bombardeio. – ela respondeu olhando para o céu.
- Sempre o céu.
- Sempre.
Silêncio.
- Como de praxe, ótimas trocas de palavras. Mas tenho que ir, porque o galo já canta.
- Sempre ótimo falar-te. Obrigada por ter guardado um sonho bom para mim. – Disse sorrindo.
- Te vejo?
- No meu sonho, no teu sonho!
Ele riu.
Ela completou o sorriso:
- Bom acordar-te.
- O mesmo para ti, querida. Acordarei – disse com um sorriso serelepe – vendo uns pontinhos verdes toda vez que piscar.
Ela olhou para as unhas: verde-fluorescente-brega.
Riram.
Abraçaram-se.
Despediram-se.
Eram eles: queridos amigos.
_________
Quem se atreve a me dizer do que é feito o samba, Jota?

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Quimera.

Seus olhos verde-musgo procuravam algo desesperadamente para se apoiarem.

Eu senti pena da sua fragilidade infantil. Suas rugas não diziam muita coisa. Não eram, sequer, experiência. Uma criança debilitada que procurava o seio de uma mãe para se sentir protegido. Uma criança afugentada em uma pele de uva seca.

Da sua boca não mais escorria o escárnio, mas estava trêmula para gritar um choro angustiante.

E seu tronco encurvado, as pernas debilitadas... Não causava mais medo. Não era mais temido como antigamente. As pessoas agora sentem pena, dó! O peso das traições, intolerância, chicotadas, batidas! Ah, essas pesam sobre seu coração. Nunca foi amado, nunca amou. Agora o fardo do não-amor aperta tua mente. Não te servem mais bebida, aquela que sustentava suas maldades.

Teus escravos não consertaram tua cadeira de balanço favorita. Agora estais sentado no áspero chão do arrependimento. Enlouquecido. Enlouquecido pela sanidade que te fez ver o trágico rumo dos botões, que hoje desabrocharam como flores azuis e sem vida. São teus filhos, os sem-vida!

Sua mulher nem mais olha para as cores dos dias ou das noites. Ela aprendeu a ser cega. Nem os olhos da alma piscam mais para a vivência do abismo que vossa pessoa criou.

Um demônio.

Não necessita mais se enrolar no cobertor da esperança, pobre diabo, que nem o frio te quer mais.

Essas tuas chagas criam o odor da tua decomposição. Só as moscas te fazem companhia! Os urubus te cercam interessados na tua herança.

- xóóó! – grita para eles.

Sua voz não passa da garganta, não é?

Nem teus cascos servem mais de ataque.

Não-causa-mais-medo!

Não adianta desejar ardentemente a morte. Essa só virá depois de teres sofrido até a última gota, e ainda resta um frasco inteiro.

Fique só você, tuas moscas, os urubus e a solidão.

Toda sua companhia inseparável.

Mas antes de sair... Ah! Antes de sair, eu cuspo no chão ao teu lado para mostrar-te o nojo que tenho da tua decadência... Aquela que sempre desejei ver em teus famigerados olhos!

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Entre pensamentos e ações.

Soprou um novo momento. Não um começo. Apenas mais um dia em que abri os olhos para viver, mas eu estava escassa de mim. Tudo estava lá, menos eu. Todos os móveis e eu em lugar nenhum. O tempo foge - como fogem os pássaros dos predadores. Voam rápidos.

Quero paz.

Quero cores novas.

Embora tudo continue como está.

Menos eu. Eu não estava lá.

Eu não existia.

O céu estava com cara de domingo: limpo e com algumas afastadas nuvens sem sardas.

Eu, estava ofegante. Andava meio depressa.

Cheguei ao meio do jardim e parei. Olhei o céu naquela imensidão.

Afundei os joelhos na terra fofa e usei minhas mãos de apoio.

Sentia a terra pulsando em meus dedos. Estava viva, úmida, com o cheiro da chuva.

Eu tremia e uma lágrima brincou pela minha face e despencou, como se despencam os suicidas das pontes.

Era solidão.

A porta bateu. Respirei longamente duas vezes seguidas. A primeira foi dor. A segunda, alívio.

Então eu joguei as fotos pela janela. E cortei os botões azuis das rosas.

Não existia mais nada.

Não existia você. Não existia os móveis.

Tudo saiu do lugar e novas cores amanheceram.

Eu estava lá, finalmente.

Viva. A vontade de existir pulsava no meu sangue.

Finalmente eu me sentia.

E como era bom me sentir.

Um sorriso agora.

Era liberdade.

Eu a sentia nas minhas veias. Uma liberdade com um toque de solidão, mas não importava. Eu me pertencia, eu era livre.

Nesse momento, a terra passou a sentir minha vivacidade.

Estava viva, morna e com cheiro de liberdade.

quarta-feira, 9 de julho de 2008



Viver.dói.,também!.





segunda-feira, 7 de julho de 2008


Um mosaico!

de

p e -

d a -

ç os


coloridos.


Cada pedaço tem um céu.
Cada céu um sentimento.
Cada sentimento com um pouco de cor.
Cada cor uma aquarela de esperança.

Pintam-se os quadros em esperança.
As formas se contornam aos poucos.
Quando cada personagem conhece um pouco do outro neles mesmos.
Um pouco de mim em você e um pouco de você em mim.

E as surrealidades - que muitos vêem - estão apenas na vivência individual.
Em outras dimensões, quem sabe, não passam de realidades normais.

Quem sabe, sabe?
Ninguém viu... Ninguém viu.

Está além do que podemos traçar.
Objetos abstratos quase inaudíveis na redoma em que viveis,
Decifrados apenas pelos que hedonizam.

Eis o segredo: S E N T I R !


sexta-feira, 30 de maio de 2008

Entre monstros e contos...

Ficar no escuro não é tão desagradável quanto eu achava há um tempo. É, creio que cresci! Pena ter perdido parte da inocência nesse período. No entanto, alguns fantasmas sempre permanecem; por mais que sumam por um tempo, eles voltam. Algumas coisas nunca mudam. Nunca mesmo.

Ultimamente correr para encontrar o sol virou hobbie, alguma coisa tem que ficar quente. Não que exista um pedaço de gelo, há um (r)esfriamento de lágrimas não caídas. Passam a fazer parte dessa realidade outras ilusões.

As especulações sobre qualquer coisa têm incomodado tanto que me pergunto se tudo vale à pena mesmo. Existem coisas que ninguém merece ouvir, outras que nunca serão ditas ou subentendidas. Pequenos fantasmas continuam criando propensões a catástrofes.

É... Algumas coisas nunca mudam!

Dentro de você, quantos vultos existem?

A madrugada não é mais tão apreciada como antes. Há outros vícios agora. Algumas músicas continuam fazendo falta e uma parcela de pessoas foram embora. Eu continuo inspirando a vida entre o que não faz sentido e as significações. Um sono interrompido. Porém, nem tudo é assombração. No decorrer de incontáveis minutos, descobre-se que algumas assombrações eram sombras de um objeto qualquer. O medo se esvai.

A cabeça tem importunado mais esses dias. Feridas que não eram para existir acabam exteriorizando coisas que pensava que se extinguiram. Expirando a vida em um sono sem poder dormir. Outras assombrações já não são puramente sombras. Não se pode fugir de especificidades.

Não existe esconderijo eficaz quando sua paz é ameaçada constantemente. Não tem acordar só você, uma brisa e um pensamento bom voando.

Às vezes, eu só quero poder respirar, apenas tudo isso.

Dê-me um pouco de tempo, ok?


Just a little time... for my breath.


Ps: Choveu um pouco hoje. O tempo estava meio oscilante. Ora nublado ora sol. E assim demarco meu dia. Prefiro lembrá-lo pelo céu que a cor fez do que pelas datas que compõem as horas. Uma pequena mania, só isso.




Catherine Menon*, memórias de fantasma.



Dans l’avenir et lê passé.

____________

* Catherine Menon é uma personagem criada por mim para uma história que ainda não saiu da minha cabeça. Contudo ela já se faz presente em alguns contos meus.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Formas de amor.

Anacronismo amoroso

Porquanto houver luz

Na claridade de [alg]um[s] sorriso[s].

Na pintura de dois semblantes multi-coloridos.

Um amor meio-bossa-nova, meio-velha-guarda

Pintado com um blues de negritude

e as passadas de um jazz passado.

Era amor. Um amor pretérito que pré-extinguido

Não era acabado, mas extinto.

Sem preconceito.

Sem pré-conceitos. Sem idéias

pré-concebidas.

Vanguarda sem linearidade

Nova tendência esse amor

meio-velha-guarda meio-bossa-nova!

Denotação de fervor

Conduta nova

Contemporâneo quase não conhecido, esse tal amor.




...

"Um pouco de calor em noites frias
E sonhos em dias de insônia.
Cantarei as melodias dos seus passos
Desenharei o barulho do teu sorriso
Velarei pelos piscares de olhos
Teus olhos. Meus olhos.
Olhos nossos, tão juntos, tão amados...
Tão velados..."



Um tilintar na memória

~> Foi assim no primeiro instante

A primeira valsa

O primeiro beijo...

O primeiro abraço ficou,

A saudade voou como borboleta nova

A valsa acabou,

O beijo passou.

O vestido coloridamente pintado

Desbotou com o tempo.

As traças fizeram um bom trabalho também.

Tirei do baú as lembranças.

Joguei fora os retratos.

Enfim, aquilo dentro do peito

Que aconteceu no primeiro instante

Não passou

Não voou

Não desbotou

Ficou.

Depois que você se foi, eu fiquei,

Você levou o tocar

Eu fiquei com o sentir.

E não é tão agradável assim.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Enantiose.

Eu poderia ter gostado de você. Poderia ter experimentando sensações novas com essa probabilidade. Entretanto, quando a possibilidade do sentimento amanheceu, começou formar para chover e a ventania, que antecede a chuva, varreu para longe de mim o gostar.
Contudo, o que mais desafina a canção que um dia poderia ter sido nossa, é a indecisão.

Você é tão indeciso quanto um bêbado na hora de atravessar a rua.

O tempo escorre enquanto o bêbado fica analisando o melhor momento de sentir o cheiro das pegadas sendo deixadas para trás. E o que é mais desgastante entre o período da indecisão e o som dos primeiros passos, é que talvez o que esteja no outro lado da rua não mais vai estar quando o bêbado chegar.
Eu não gosto de você. Assim, não gosto. Talvez eu goste de outro alguém. Mas de você eu não gosto. Te vejo trancado do lado de dentro, porque o medo que você tem de ficar preso do lado de fora é maior. Bom, caso isso aconteça, vou te lembrar que bem na esquina existe um chaveiro, caso você precise. E, se por um acaso você topar com o bêbado, verá que os espelhos formarão entre si um ângulo e as milhares de imagens compostas te deixarão tonto. Nesse momento, recomendo que você vá para casa tratar da ressaca.

Por fim, a ficha caiu, mas a ligação há muito tempo havia sido cortada.

Enquanto você estiver andando para casa desprovido de profundidade, eu estarei imersa em alguma sagacidade. À medida que você estiver na sua superficialidade, eu estarei mergulhada na plenitude de querer beijos em poesia, abraços em prosa e o silêncio literário das bocas.
Entre as gigantes passadas que nos separam, algum resquício de memória mostra a pequenez efêmera de um passado que nunca nos pertenceu. Quando o tempo das lembranças chegarem, talvez você não precise mais curar sua ressaca e já ande com uma chave no bolso e eu, com certeza, estarei experimentando alguma asa e já tenha voado para mais longe de ti do que você de mim.

No final, quase antônimos: você que nunca gostou de mim e eu que quase gostei de você.

sábado, 22 de março de 2008

Metamorfose regressiva.

Aquela janela de madeira velha

Torturada por lembranças de olhares

Palavras de um adeus

E pela tua imagem dolosa que acabo de ver passar

Foi marcada pelo transformismo do teu semblante:

Uma cor descolorida na tua pele;

Olhos desbotados de existência

E a memória de que um dia alguém foi.

Aquele perfume adocicado

Substituído pelo cheiro de cigarro

E o emblema sereno

Que outrora fora seu sorriso

Foi impregnado de fumaça.



Sorrateiramente demudada em restos.



E a recompensa de tanto desgasto

É a solidão que te acomete

E a paranóia de vossa mente

Teus brinquedos de devaneios translúcidos

Que afirmava ser salvação

Tornou motivo da tua morte lenta.

E a ti sobrou o nada:

Subjugada ao menosprezo

Das tuas futuras

Cinzas decrépitas

As quais

A terra rejeitará

Por tamanha

P O D R I D Ã O

sexta-feira, 7 de março de 2008

Resposta.

São alguns (muitos) dias sem te dar resposta para aquela sua carta, eu sei. Mas não foi por displicência. Na verdade, foi porque não queria responder assim naquele momento, estava tão extasiada que resolvi esperar as borboletas, os tigres e os dragões se acalmarem dentro de mim. É assim que as coisas ficaram depois que li aquela sua (não-última) carta.

Sabe, existem alguns sentimentos dentro de mim que eu não fazia idéia de que existiam, ou não existia e você os criou. O fato é que eu vivo tendo déjà vus emocionais. Parece difícil de acreditar né? Contudo, todos os sentimentos meus que são seus, parecem que há muito tempo estavam guardados e só foi você aparecer para me ensinar o lugar onde eles estavam. É confuso e eu não consigo entender e às vezes, eu nem quero. É tão bom sentir que deixo apenas assim... Na abstração de um plano alfa só meu.

Coisas só nossas. Lembrei disso agora. Das coisas só nossas. Coisas que não comento com ninguém, porque só quero pra mim. Músicas, palavras, frases, brincadeiras, a sintonia na hora de pensar. Ah, e as risadas, claro! Uma das coisas que mais gosto são as que deixamos subentendidas, elas costumam causar um furor a mais nos dragões, tigres e borboletas dentro mim. Chega a ser engraçado e sim, eu acabo rindo de mim.

E os sinais! Sim, sim, os sinais. Os sinais que acabamos deixando para o outro. Algumas coisas codificadas. Afinal, para quê dividir com os outros o que só diz respeito a nós? (Vai aí mais um sinal). E os segredos não tão secretos que ficam codificados por aí.

[...]

Saudades de você. Essa teimosa saudade que nunca passa e parece que sempre aumenta. Essa saudade que me faz te procurar em toda música que eu escuto e nos sonhos mais malucos. Essa saudade que aperta, mas não é ruim de sentir.

[...]

Escrevi demais. Escrevi coisas que estão longe de serem explicadas tão bem, senão sentidas. Usei a palavra sentir e suas variações demais também. Entretanto, não tinha uma palavra que se encaixasse melhor... Você é isso: um sentir quase palpável. É, esquece o que escrevi acima e só sente, é melhor. No mais, só quero saber como vai você.

Beijos, estou com saudades (como de costume).

Se cuida.

Sem assinatura.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Inquietações viventes. Morfina do prazer.

Eu tinha acabado de chegar da rua. Ainda estava atordoado com aquelas palavras, elas estavam zunindo na minha cabeça. Joguei as chaves na mesinha do centro e me atirei no sofá. Passei a mão pelos cabelos e pela minha barba.

Havia tempo que eu não a via. Finalmente ela me atendeu numa das minhas milhares de ligações e marcamos um encontro. Aquele barzinho com música ao vivo era bem agradável. Quando cheguei, ela já estava lá sentada com um copo nas mãos e olhando para o nada. Sentei-me a sua frente e ela voltou à realidade.

- Ei John.

- Oi Sofia! Errr... Como você está?

- Você não me chamou aqui para isso, John. Por que não vai direto ao assunto?

Eu olhei seu rosto e me fixei nos seus olhos – Você simplesmente sumiu. O quê aconteceu?

Ela me olhou com seus olhos brilhantes, deu um sorriso, virou o rosto e deu um gole na sua bebida. Depois seus olhos voltaram aos meus.

- Sabe como é né, John. O tédio conseguiu vencer a relação. Nós caímos na monotonia e eu quis me livrar disso.

- Ah! Entendi, Sofia, você se enjoou e resolveu me mandar, vamos dizer, passear e...

Ela me interrompeu:

- Não quis causar constrangimentos e nem quero brigar, John. Você cometeu seus erros e eu te perdoei por isso. Agora é sua vez de esquecer essa minha falha de não ter te dado respostas.

- Será que você pode me dar respostas agora, Sofia?

- Pra quê você as quer, John? É melhor continuarmos com nossas vidas.

- Exatamente, Sofia. Eu quero continuar com minha vida, mas preciso preencher a lacuna que você deixou nela.

- Sabe John, nós...

Foi minha vez de interromper:

- Sofia, eu não esqueci o quê você já me fez sentir e eu quero ter isso de novo. Quer saber, eu nem ligo se você sumiu, eu só quero saber se ainda tenho chances de voltar a fazer parte de você.

Ela ficou séria, olhou-me demoradamente, depois disse:

- Eu quero intensidade. A intensidade que me faça conhecer sentimentos que eu jamais ousaria dizer que existem. Eu quero me sentir viva no mais alto grau que isso signifique. Você pode me dar isso, John? Você pode?

Depois disso ela pegou a bolsa e saiu. Eu fiquei lá parado sem ação. O quê dizer? O quê ela queria dizer?

Voltei para casa, joguei as chaves na mesinha do centro e me atirei no sofá. Passei a mão pelos cabelos e pela minha barba...

Pequenas memórias.

Sabe aquelas caixas que guardamos coisas antigas? Aquelas caixas que têm cartas velhas, aquela flor secada dentro de um livro, fotos e etc e tal? Então, ontem eu abri uma dessas minhas caixas e devo dizer que me deu aquela sensação de prazer e trabalho realizado [?]. Bem, digamos que trabalho realizado, porque eu me lembrei de tantas coisas passadas das quais não me arrependi de ter feito ou deixado de fazer que chegou dar aquela sensação de dever cumprido. Enfim, voltando à minha caixa antiga... Eu saí abrindo cartas que recebi e cartas que nunca enviei, li poemas antigos, pensamentos antigos e ri bastante do modo como eu via as coisas. Ri dos erros de português, da minha letra e chorei... Chorei depois de ter lido uma carta que não mandei e de uma carta que recebi. Chorei quando via fotos de quando eu era pequena, fotos de amigos. Nesse momento minhas lágrimas contornavam o sorriso que se formava no meu rosto. Bom mesmo é sentir saudade de momentos que não deixarão de existir na nossa memória. Digo ainda: “Mate-me se perder a memória por completo. Posso esquecer quem sou, mas nunca esquecer dos momentos que me fizeram sorrir e das pessoas que me fizeram conhecer a felicidade”. Remexendo mais as coisas daquela caixa, encontrei ao fundo dela um diário antigo. Remexi mais um pouco e achei a chave. Lá se vai o momento de tensão e curiosidade extrema de recordar os segredos que eu nem lembrava mais que um dia havia tido. Bom, vou logo dizendo que nunca remexi tantos sentimentos dentro de mim. Além de relembrar segredos, eu relembrei emoções. Vou te contar viu, que coisa lindamente bizarra essa de relembrar emoções. Voltando ao conteúdo do diário, é possível se contorcer de rir de você mesmo? Sim, é. Eu ri de como eu era boba, dos meus amores platônicos, da minuciosidade de detalhes de momentos, de personagens de livros, das tempestades em copos d’água. E li várias páginas sobre crises existenciais, mudança de personalidade, gritos internos e todas aquelas coisas de transição.

Por fim, era como se eu tivesse feito uma viagem no tempo. E sabe, quanto mais o tempo passa, mais as coisas ficam complicadas e cheia de pormenores impetuosamente estressantes. O ideal é tentar congelar o tempo no melhor da vida. Não que você vá achar uma fonte da juventude, não é isso. É você tentar preservar os melhores sentimentos, já tentou?

Aí chegou a hora de guardar a pequena bagunça que havia feito. Guardando tudo de volta naquela caixinha forrada de papel de presente. Guardando saudades. Guardando lembranças. Guardando sentimentos. Guardando sorrisos e lágrimas misturados a tintas de canetas e cores de fotografias. Guardando laços invisíveis que só nós mesmos sabemos.

Monólogo invisível ao espelho

Se é possível, não sei...

Se for impossível pode haver uma exceção,

Algo ímpar ou sentimento sem plural?

Se eu me jogo, eu me aparo...

Se caio, recupero...

Machucados?

Só restam cicatrizes pequenas.

Sensibilidade insensível!

Não sei... Não sei... Não sei

Não sei se amo. Não sei se odeio.

Não sei de você.

Na verdade, não sei de mim.

Medo. Já sentiu?

Sofrimento, já causou?

Se o pra sempre agora acabou

- Como vai ser?

Fingir algo que presente

Não sinto. Ou seria antagônico?

Será que sinto ainda? Ou nunca existiu?

Ou nunca existi?

- Uma pergunta: Vale à pena?

Confuso.

- Luz sobre o papel de carta, por favor!

Ou há luz e não enxergo?

- Merda!

Pergunto de novo: “Vale à pena?”

- Responda!

*Eco*

As flores murcharam.

Na verdade foi tudo muito pequeno. Sim, pequeno. Pequeno de uma maneira que se tornou vazia e as lembranças ficaram distantes como se eu não lembrasse detalhadamente. Não foi difícil, nem doloroso, nem lamentoso... Foi indiferente. Sem sentimento, sem amor, sem culpa... E o “eterno enquanto dure” foi quebrado em milhares de partes como uma peça de cristal espatifada que acabou sendo varrida para debaixo do tapete. O que se passou ficou pequeno, minúsculo, amiúde. Veio, aconteceu e já foi... Sem voltas, sem saudades, sem nada.